segunda-feira, 11 de novembro de 2013

A NOVA TERRA NÃO É UMA UTOPIA


  • Será que a noção de uma nova Terra não passa de mais uma visão utópica? De maneira nenhuma. Todas as utopias têm isto em comum: a projeção mental de um tempo futuro em que tudo ficará bem, seremos salvos, haverá paz e harmonia e nossos problemas terão terminado. Houve muitas expectativas dessa natureza. Algumas delas terminaram em decepção; outras, em desastre.

  •  No centro de todas as visões utópicas se encontra uma das principais disfunções estruturais da velha consciência: buscar a salvação no futuro. A única existência que o futuro tem de verdade é como uma forma de pensamento. Portanto, nesse caso, estamos procurando inconscientemente a salvação na nossa própria mente. Assim, permanecemos presos à forma, e ela é o ego.

  •  "Vi, então, um novo Céu e uma nova Terra",5 escreve o profeta bíblico. O fundamento para uma nova Terra é um novo Céu - a consciência desperta. A Terra - realidade externa - é apenas seu próprio reflexo exterior. O surgimento de um novo Céu e, por implicação, de uma nova Terra não é um acontecimento futuro que irá nos libertar. Nada nos libertará porque apenas o momento presente pode fazer isso. Essa percepção é o despertar. Como evento futuro ele não tem significado porque é a própria manifestação da presença. Assim, o novo Céu, a consciência desperta, não é um estado futuro a ser atingido. Um novo Céu e uma nova Terra estão surgindo dentro de nós neste momento e, se isso ainda não estiver acontecendo, é porque eles não passam de um pensamento na nossa cabeça e, portanto, não se estabelecerão mesmo. O que disse Jesus aos seus discípulos? "O reino de Deus já está dentro de vós."6

  •  No Sermão da Montanha, Jesus faz uma predição que até hoje é entendida por poucos. Ele diz: "Bem-aventurados os mansos, porque possuirão a Terra."7 Nas versões modernas da Bíblia, a palavra "mansos" é traduzida como "humildes". Quem são os mansos, ou os humildes, e o que significa o fato de que eles possuirão a Terra?

  •  Os mansos são os que não têm ego. Aqueles que despertaram para sua verdadeira natureza essencial como consciência e a reconhecem em todos os "outros", em todas as formas de vida. Vivem no estado de rendição e, assim, sentem que são um só com o todo e com a Origem. Eles incorporam a consciência desperta que está mudando todos os aspectos da vida no nosso planeta, incluindo a natureza, porque a vida na Terra é inseparável da consciência humana que percebe e interage com ela. Esse é o sentido de "os mansos possuirão Terra".

  •  Uma nova espécie está surgindo no planeta. Ela está surgindo agora, e você faz parte dela!

Os doadores de frequência


  • O movimento de saída que se direciona à forma não se expressa com igual intensidade em todos nós. Algumas pessoas têm uma forte ânsia de construir, criar, envolver-se, conquistar, exercer uma influência sobre o mundo. Se elas estiverem inconscientes, o ego irá, é claro, controlar e usar a energia do ciclo de saída para seus próprios interesses. Isso, porém, reduz de modo significativo o fluxo de energia criativa disponível para elas. Assim, cada vez mais, dependerão do "esforço" para conseguir o que querem. Caso estejam conscientes, esses indivíduos em que o movimento de saída é forte serão altamente criativos. Outros, porém, levarão uma existência aparentemente discreta e passiva depois que a expansão natural que acompanha o crescimento tiver seguido seu curso. 

  •  Essas pessoas são mais introvertidas por natureza. No seu caso, o movimento de saída que se direciona à forma é mínimo. Elas preferem voltar para casa a sair. Não alimentam nenhum desejo de mudar o mundo nem de se envolver nessa questão. Se têm alguma ambição, essa normalmente se reduz a encontrar uma ocupação que lhes proporcione certo grau de independência. Algumas delas acham difícil se encaixar neste mundo. Outras têm sorte o bastante para encontrar um nicho protetor onde conseguem levar a vida com relativa segurança, realizando um trabalho que lhes provê um rendimento regular ou administrando um pequeno negócio próprio. Há as que se sentem atraídas a viver numa comunidade espiritual ou num mosteiro. Outras podem se tornar desajustadas e viver à margem da sociedade por acharem que têm pouco a ver com ela. Existem as que se voltam para as drogas porque acreditam que viver neste mundo é doloroso demais. Por fim, há as que acabam se tornando agentes de cura ou mestres espirituais, isto é, mestres do Ser.

  •  Em épocas passadas, talvez essas pessoas fossem chamadas de contemplativas. Na civilização contemporânea parece não existir um lugar para elas. Na nova Terra que está surgindo, seu papel, contudo, é tão importante quanto o dos criadores, realizadores e reconstrutores. Sua função é portar a freqüência da nova consciência neste planeta. Eu as chamo de doadores de freqüência. Elas estão aqui para gerar a consciência por meio de atividades da vida diária, das suas interações com os outros e do fato de "simplesmente existirem". 

  •  Dessa maneira, elas dotam de um profundo sentido aquilo que parece insignificante. Sua tarefa é trazer o amplo silêncio para este mundo, mantendo-se totalmente presentes em qualquer coisa que façam. Por causa dessa consciência há qualidade em suas realizações, até mesmo na mais simples tarefa. Seu propósito é fazer tudo de maneira sagrada. Como cada indivíduo é uma parte integrante da consciência coletiva humana, elas afetam o mundo com muito mais intensidade do que mostra a superfície de suas vidas.

O entusiasmo


  • Enfim, existe outro modo de manifestação criativa que pode ocorrer àqueles que permanecem coerentes com seu propósito interior de despertar. De repente, um dia, eles ficam sabendo qual é seu propósito exterior. Têm uma grande visão, uma meta, e, dali por diante, trabalham no sentido de implementá-la. Em geral, ela costuma estar ligada de alguma maneira a algo que eles apreciam e que já estão realizando numa escala menor. É nesse ponto que entra a terceira modalidade de ação desperta: o entusiasmo.

  •  O entusiasmo mostra que existe um profundo prazer no que fazemos e o elemento adicional de uma meta ou de uma visão em nome da qual trabalhamos. Quando acrescentamos uma meta ao prazer proporcionado por nossa ação, o campo energético ou freqüência vibracional muda. Certo grau do que podemos chamar de tensão estrutural é agora acrescentado ao prazer e, assim, ele se transforma em entusiasmo. No ponto máximo da atividade criativa alimentada por esse sentimento haverá enorme intensidade e energia por trás do que executamos. Vamos nos sentir como uma flecha em direção ao alvo - e sentindo prazer no trajeto. 

  •  Aos olhos de um espectador pode parecer que estamos sob estresse contínuo, porém a intensidade do entusiasmo não tem nada a ver com tensão. Só nos estressamos quando nossa intenção de atingir a meta é maior do que a vontade que temos de fazer o que estamos realizando. Nesse caso, o equilíbrio entre prazer e tensão estrutural se perde, e esta última vence. O estresse costuma ser um sinal de que o ego voltou e, assim, nos privamos da energia criativa do universo. Em seu lugar restam apenas a força e a tensão do desejo egóico. Com isso, precisamos lutar e "trabalhar duro" para alcançar o objetivo. A tensão diminui tanto a qualidade quanto a eficácia do que executamos sob sua influência. Também existe uma forte ligação entre ela e as emoções negativas, como ansiedade e raiva. O estresse é tóxico para o organismo e vem sendo reconhecido como uma das principais causas das chamadas doenças degenerativas, entre as quais o câncer e os males cardíacos.

  •  Ao contrário da tensão, o entusiasmo tem uma elevada freqüência energética e assim vibra em consonância com o poder criativo do universo. É por isso que Ralph Waldo Emerson disse: "Nada grandioso jamais foi alcançado sem entusiasmo:"2 A palavra "entusiasmo" deriva do grego antigo - en e theos, que significa "em Deus". O termo correlato enthousiazein corresponde a "estar possuído por um deus". Com o entusiasmo, descobrimos que não precisamos fazer tudo sozinhos. Na verdade, não existe nada importante que possamos executar sozinhos. O fluir constante do entusiasmo produz uma onda de energia criativa, e tudo o que temos a fazer então é aproveitá-la. 

  •  O entusiasmo confere um imenso poder ao que realizamos, por isso todos aqueles que não buscam o acesso a essa energia poderão olhar para nossas" conquistas com assombro e equipará-las a quem nós somos. No entanto, nós conhecemos a verdade que Jesus ressaltou quando disse: "De mim mesmo não posso fazer coisa alguma."3 Ao contrário do querer egóico, que gera oposição em proporção direta à intensidade do seu desejo, o entusiasmo nunca produz confronto. Sua atividade não cria vencedores nem perdedores. Ele se baseia na inclusão dos outros, e não na sua exclusão. Não precisa usar nem manipular as pessoas, pois é a energia da criação propriamente dita e, assim, não tem necessidade de extrair energia de nenhuma fonte secundária. Enquanto o desejo do ego sempre tenta tirar de alguma coisa ou de alguém, o entusiasmo contribui com sua própria abundância. Quando encontra obstáculos na forma de situações adversas ou de pessoas que não cooperam, ele nunca os ataca. Ao contrário: ou os contorna, ou cede, ou os aceita, convertendo a energia oposta numa energia útil, o inimigo num amigo.

  •  O ego e o entusiasmo não podem coexistir. Um implica a ausência do outro. O entusiasmo sabe para onde está indo, embora, ao mesmo tempo, esteja alinhado com o momento presente, a fonte da sua vitalidade, do seu prazer e do seu poder. Ele não "quer" nada porque não sente falta de nada. Encontra-se num estado de unificação com a vida. E, por mais dinâmicas que sejam as atividades inspiradas por ele, não nos perdemos nelas. Há sempre um espaço silencioso, mas intensamente vivo, no centro da ação, um núcleo de paz em sua essência - ele é a fonte de tudo e, ainda assim, permanece intocado pelo que quer que seja. 

  •  Por intermédio do entusiasmo entramos em completo alinhamento com o princípio criativo que emana do universo, sem, contudo, nos identificarmos com suas criações, isto é, com o ego. Quando não existe identificação, não existe vínculo - uma das maiores causas do sofrimento. Depois da passagem de uma onda de energia criativa, a tensão estrutural diminui novamente, enquanto nosso prazer com o que estamos fazendo permanece. Ninguém pode viver num estado permanente de entusiasmo. Uma nova onda de energia criativa poderá surgir mais tarde e produzir um entusiasmo renovado. 

  •  Quando o movimento de retorno direcionado à dissolução da forma se estabelece, o entusiasmo não nos serve mais, pois ele pertence ao ciclo de crescimento e expansão da vida. É apenas pela resignação que conseguimos nos alinhar com o movimento de retorno - a jornada de volta ao nosso lar.

  •  Resumindo: o prazer com aquilo que realizamos, combinado a uma meta ou visão para a qual trabalhamos, transforma-se em entusiasmo. Embora tenhamos um objetivo, o que estamos fazendo no momento presente tem que permanecer como o ponto focal da nossa atenção. Caso contrário, não estaremos mais em sintonia com o propósito universal.

  •  Não deixe que sua visão ou meta seja uma imagem inflada de si mesmo e, portanto, uma forma disfarçada do ego, como querer tornar-se uma celebridade do cinema ou da televisão, um escritor famoso ou um empreendedor milionário. Procure também se assegurar de que sua meta não esteja concentrada em ter alguma coisa, como uma mansão de frente para o mar, sua própria empresa ou uma fortuna no banco. Uma auto-imagem exacerbada ou uma visão de si mesmo como alguém que tem isso ou aquilo são propósitos estáticos e, portanto, não lhe dão poder. Em vez disso, torne seus objetivos dinâmicos, isto é, voltados para uma atividade em que você esteja envolvido e pela qual se ligue a outros seres humanos, assim como ao todo. Em lugar de se ver como alguém famoso, imagine que seu trabalho está sendo a fonte de inspiração para um grande número de pessoas e enriquecendo a vida delas. Observe como essa atividade aprimora ou aprofunda não apenas sua vida como a de muita gente. Sinta-se como uma abertura pela qual a energia flui da Origem não manifestada para toda a vida em benefício de todos. 

  •  Tudo isso requer que sua meta ou visão já seja uma realidade dentro de você, no nível da mente e do sentimento. O entusiasmo é o poder que transfere o projeto mental para a dimensão material. Esse é o uso criativo da mente, e é por isso que, nesse caso, não há envolvimento do querer. Você não pode manifestar o que quer, só é capaz de expressar o que já tem. Embora possa conseguir o que deseja por meio de muito trabalho e estresse, essa não é a maneira de ser da nova Terra. Jesus nos deu a chave para o uso criativo da mente e para a manifestação consciente da forma quando disse: "Por isso vos digo: tudo o que pedirdes na oração, crede que tendes recebido, e ser-vos-á dado."4

O Prazer


  • A paz que acompanha a ação resignada transforma-se numa grande animação quando gostamos de verdade do que estamos fazendo. O prazer é a segunda modalidade da ação desperta. Na nova Terra, ele substituirá o querer como a força motivadora dos nossos atos. O querer deriva da ilusão do ego de que somos um fragmento isolado que está desligado do poder que se encontra por trás de toda criação. Por meio do prazer, nos conectamos a esse poder criativo universal. 

  •  Quando tornamos o momento presente, e não o passado nem o futuro, o nosso ponto focal, a capacidade que temos de gostar do que estamos fazendo aumenta extraordinariamente e, com ela, a qualidade da nossa vida. A alegria é o aspecto dinâmico do Ser. Sempre que o poder criativo do universo está consciente de si mesmo, ele se manifesta como prazer. Não precisamos esperar que aconteça algo "significativo" para que possamos nos alegrar com o que realizamos. Existe mais significado no prazer do que podemos precisar. A síndrome de "esperar para começar a viver" é um dos erros mais comuns do estado inconsciente. A expansão e a mudança positiva no nível exterior têm muito mais probabilidade de ocorrer na nossa vida se formos capazes de sentir prazer no que já estamos empreendendo, em vez de esperarmos por uma mudança para então passarmos a gostar do que fazemos.

  •  Não peça permissão à sua mente para apreciar o que você faz. Tudo o que obterá como resposta será uma série de motivos pelos quais não poderá sentir prazer naquilo. "Não agora. Não vê que está ocupado? Você não tem tempo. Talvez amanhã possa começar a sentir prazer...", dirá a mente. Esse amanhã nunca chegará, a não ser que você comece a sentir prazer com o que está executando agora. 

  • Sempre que dizemos "gosto de fazer isto", na verdade estamos cometendo um equívoco. Isso dá a impressão de que o prazer vem da ação, mas não é o caso. Ele flui para o que estamos fazendo e, dessa maneira, para o mundo, partindo do nosso íntimo. O erro de pensar que o prazer tem origem naquilo que executamos é normal. Porém, é também perigoso porque cria a idéia de que ele pode ser produzido por alguma coisa ou atividade. Assim, esperamos que o mundo nos dê prazer, felicidade. Entretanto, o mundo não consegue fazer isso. É por esse motivo que muitas pessoas vivem num permanente estado de frustração. A realidade não lhes concede aquilo de que elas pensam que precisam.

  •  Então, qual é a relação entre algo que estamos fazendo e o prazer? Sentimos prazer com qualquer atividade em que estejamos plenamente presentes, com toda ação que não seja apenas um meio para alcançarmos um fim. O que nos proporciona essa sensação não é o ato que executamos, e sim a energia vital que flui para ele. Essa animação e o que nós somos existem como uma coisa só. Isso significa que, quando temos prazer em fazer algo, estamos de fato sentindo a alegria do Ser no seu aspecto dinâmico. E por isso que tudo o que nos dá prazer nos coloca em contato com o poder que está por trás de toda criação. 

  •  Vou apresentar agora uma técnica espiritual que proporcionará mais poder e expansão criativa à sua vida. Faça uma lista das atividades cotidianas que você executa com freqüência. Inclua aquelas que considera desinteressantes, chatas, entediantes, irritantes ou estressantes. No entanto, não acrescente nada que você odeia ou detesta fazer - esses são casos para aceitação ou para deixar de realizar essas ações. Da relação podem constar a ida para o trabalho e a volta para casa, a compra de mantimentos, a preparação da comida ou qualquer coisa que você considere maçante ou estressante na sua rotina diária. Depois, quando estiver executando essas atividades, permita que elas sejam um veículo para o estado de alerta. Esteja absolutamente presente no que está fazendo e sinta sua atenção, o silêncio vivo dentro de você, como o pano de fundo desse ato. Logo descobrirá que, em vez de estressante, monótona ou irritante, sua ação no estado de consciência elevada acaba se tornando agradável. Para ser mais preciso, o que lhe dá prazer não é a ação externa em si, mas a dimensão interna da consciência que flui para ela. Isso é encontrar a alegria do Ser no que você está executando. Caso sinta que não há significado na sua vida ou que ela está cheia de tensão ou tédio, é porque ainda não incorporou essa dimensão. Agir com a consciência desperta ainda não se tornou seu objetivo principal.

  •  A nova Terra surge à medida que um número cada vez maior de pessoas vai descobrindo que seu propósito mais importante na vida é trazer a luz da consciência a este mundo e, assim, usa suas ações, sejam elas quais forem, como um veículo para a consciência.

  •  A alegria do Ser é a alegria de estar consciente.

  •  Então, a consciência desperta toma conta do ego e começa a conduzir nossa vida. Podemos descobrir que uma atividade em que estivemos envolvidos por um longo tempo começa a se tornar naturalmente algo bem maior quando fortalecida pela consciência.

  •  Algumas das pessoas que, por meio da ação criativa, enriquecem a vida de muitas outras estão simplesmente fazendo aquilo de que mais gostam - não têm a intenção de alcançar nada nem de se tornar nada por meio dessa atividade. Podem ser músicos, artistas plásticos, escritores, cientistas, professores, construtores ou indivíduos que criam novas estruturas sociais ou empresariais (negócios conscientes). Há casos em que sua esfera de influência permanece restrita durante alguns anos. Depois, súbita ou gradualmente, uma onda de poder criativo flui para o que eles estão executando. Assim, sua atividade se expande ultrapassando tudo o que possam ter imaginado e atinge um número imenso de pessoas. Além do prazer, uma intensidade é agora acrescentada às suas realizações e, com ela, surge uma criatividade que supera qualquer coisa que um ser humano comum poderia empreender.

  •  Em casos como esse, não devemos deixar que isso nos suba à cabeça porque um remanescente do ego pode estar se escondendo justamente ali. Ainda seremos um ser humano comum. O que é de fato extraordinário é o que entra no mundo por nosso intermédio. Mas essa é uma essência compartilhada por todos os seres. Hafiz, poeta persa do século XIV e mestre sufista, expressa essa verdade de forma maravilhosa: "Sou como um orifício na flauta pelo qual passa o sopro de Cristo. Ouça a música."1

A aceitação



  • Embora possamos não gostar de fazer determinadas coisas, precisamos ao menos aceitar que temos de executá-las. Aceitação significa o seguinte: por enquanto, o que esta situação, este momento, requer de mim é isto, então eu o faço de boa vontade. Já tratei da importância da aceitação interior do que acontece - e a aceitação do que devemos fazer é apenas outro aspecto disso. Por exemplo, provavelmente você não vai gostar de trocar um pneu à noite num lugar deserto e em plena chuva, e muito menos ficará entusiasmado com essa idéia. No entanto, pode se resignar a aceitar esse fato. Praticarmos uma ação no estado de aceitação é estarmos em paz enquanto a realizamos. Essa paz é uma vibração energética sutil que, em seguida, se transfere para o que estamos fazendo. Na superfície, a aceitação parece um estado passivo, entretanto ela é ativa e criativa porque traz algo novo ao mundo. Essa paz, essa vibração energética sutil, é a consciência. E uma de suas maneiras de se revelar é através da ação abnegada, que é um aspecto da aceitação.

  •  Caso você não consiga encontrar prazer no que vai fazer nem aceitar que deve executar isso - pare. Caso contrário, não estará assumindo a responsabilidade pela única coisa pela qual pode de fato se responsabilizar e que também é algo que importa de verdade: seu estado de consciência. E, se você não assume a responsabilidade pelo seu estado de consciência, não assume a responsabilidade pela vida.

As três modalidades de ação desperta


  • A consciência pode fluir para o que fazemos de três maneiras e, assim, por nosso intermédio, penetrar no mundo. São três modalidades que nos permitem alinhar nossa vida com o poder criativo do universo. Modalidade corresponde à freqüência energética subjacente que chega às nossas ações e as conecta à consciência desperta que está surgindo no mundo. A menos que decorra de uma dessas três modalidades, qualquer coisa que façamos será marcada pela disfunção e pertencerá ao ego.

  •  As modalidades podem mudar no transcorrer do dia, e uma delas talvez seja predominante num estágio específico da nossa vida. Cada uma delas é adequada a determinadas situações. As modalidades de ação desperta são aceitação, prazer e entusiasmo. Cada uma delas representa uma freqüência vibracional da consciência. Precisamos estar atentos para garantir que uma modalidade permaneça ativa sempre que estivermos envolvidos na execução de algo - da tarefa mais simples à mais complexa. Caso não estejamos nem no estado de aceitação, nem de prazer nem de entusiasmo, é porque estamos causando sofrimento a nós mesmos e aos outros.

A ação desperta


  • A ação desperta é o aspecto exterior do estágio seguinte da evolução da consciência no nosso planeta. Quanto mais nos aproximamos do fim do nosso atual estágio evolucionário, maior a disfunção do ego - é uma disfunção semelhante à que ocorre com a lagarta pouco antes de se tornar borboleta. A nova consciência, contudo, está surgindo ao mesmo tempo em que a antiga se dissolve. 

  • Estamos em meio a um acontecimento da maior importância na evolução da consciência humana, entretanto esse assunto não vai sair no jornal. No nosso planeta, e talvez simultaneamente em muitas partes da nossa galáxia e além dela, a consciência está despertando do sonho da forma. Nem todas as formas (o mundo) irão se dissolver, embora seja certo que muitas desaparecerão. Isso significa que a consciência pode agora começar a criar a forma sem se perder nela. Tem como permanecer consciente de si mesma até enquanto a gera e a sente. Por que ela deveria continuar a criar e sentir a forma? Pelo prazer que essa ação proporciona. De que maneira a consciência faz isso? Por meio de seres humanos despertos que aprenderam o significado da ação desperta. 

  •  A ação desperta é o alinhamento do nosso propósito exterior - o que fazemos - com nosso propósito interior - despertarmos e nos mantermos despertos. Por meio dela, entramos no estado de unificação com o propósito que sai do universo. Através de nós a consciência flui para o mundo. Ela se derrama sobre nossos pensamentos e os inspira. Inunda todas as nossas realizações, as orienta e fortalece. 

  •  O que determina se estamos cumprindo nosso destino não é o que fazemos, e sim como fazemos. E essa maneira de realizar as coisas é estabelecida por nosso estado de consciência.

  •  Uma inversão das nossas prioridades ocorre quando o propósito principal de executarmos algo se transforma na ação em si, ou melhor, na corrente de consciência que flui para ela. Esse fluxo de consciência é o que determina a qualidade. Em outras palavras: em qualquer situação e em tudo o que fazemos, nosso estado de consciência é o fator primário, enquanto a situação e o que executamos é secundário. O sucesso "futuro" é dependente e inseparável da consciência da qual emanam as ações. Ela pode ser tanto a força reativa do ego quanto a atenção alerta da consciência desperta. Toda ação verdadeiramente bem-sucedida se origina desse campo de atenção alerta, e não do ego e do pensamento inconsciente, condicionado.

A consciência


  • A consciência já é consciente. Ela é o não-manifestado, o eterno. O universo, porém, só está se tornando consciente pouco a pouco. A consciência em si é infinita e, portanto, não evolui. Nunca nasceu e não morre. Quando ela se transforma no universo manifestado, parece estar sujeita ao tempo e a um processo evolutivo. Nenhuma mente humana é capaz de compreender plenamente o motivo desse processo. No entanto, podemos ter um vislumbre dele dentro de nós mesmos e vivenciá-lo como participantes conscientes.

  •  A consciência é a inteligência, o princípio organizador por trás do surgimento da forma. Ela vem elaborando formas por milhões de anos para que possa se expressar através delas no plano manifestado.

  •  Embora o nível não manifestado da consciência pura possa ser considerado outra dimensão, ele não está separado dessa dimensão da forma. A forma e a ausência de forma se inter-penetram. O não-manifestado inunda essa dimensão como consciência, espaço interior, presença. Como ele faz isso? Por meio da forma humana que se torna consciente e, assim, cumpre seu destino. Ela foi criada para esse propósito superior, e milhões de outras formas prepararam o terreno para ela.

  •  A consciência encarna na dimensão manifestada, ou seja, se torna forma. Quando faz isso, ela entra num estado semelhante ao sonho. A inteligência permanece, porém a consciência fica inconsciente de si mesma. Perde-se nas formas, identifica-se com elas. Isso poderia ser descrito como a descida do divino à matéria. Nesse estágio da evolução do universo, todo o movimento de saída acontece no estado semelhante ao sonho. Lampejos do despertar surgem apenas no momento da dissolução de uma forma individual, isto é, na morte. Em seguida, começa a encarnação seguinte, a nova identificação com a forma, o próximo sonho individual que faz parte do sonho coletivo. Quando o leão dilacera o corpo da zebra, a consciência que encarnou na forma de zebra se distancia da forma em dissolução e, por um instante, desperta para sua natureza imortal essencial como consciência. Em seguida, entrega-se imediatamente ao sono e reencarna em outra forma. Quando o leão envelhece e não consegue mais caçar, assim que dá o último suspiro, ocorre de novo o mais breve dos lampejos de um despertar, seguido por outro sonho com a forma.

  •  No nosso planeta, o ego humano representa o estágio final do sono universal, a identificação da consciência com a forma. Foi uma etapa necessária na evolução da consciência. 

  •  O cérebro humano é uma forma altamente diferenciada pela qual a consciência entra nesta dimensão. Ele contém em torno de 100 bilhões de células nervosas (os neurônios), quase o mesmo número de estrelas que existem na nossa galáxia, e poderia ser considerado um cérebro macrocósmico. Esse órgão não cria a consciência, no entanto a consciência o criou - como a mais complexa forma física sobre a Terra - para sua expressão. Quando ele sofre um dano, isso não significa que nós perdemos a consciência, e sim que ela não consegue mais usar essa forma para entrar nesta dimensão. E impossível perdermos a consciência porque ela é, em essência, quem nós somos. Só podemos perder aquilo que temos, e não algo que somos.

O despertar e o movimento de saida


  • A expansão natural da vida de uma pessoa, que ocorre junto com o movimento de saída, em geral é usurpada pelo ego e usada para sua própria expansão. "Veja o que eu sou capaz de fazer. Duvido que você consiga fazer isso", diz uma criança a outra quando descobre que seu corpo está ficando mais forte e ágil. Essa é uma das primeiras tentativas do ego de se destacar pela identificação com o movimento para fora e com o conceito "mais do que você" e se fortalecer pela diminuição dos outros. E claro que isso é apenas o começo dos seus muitos erros de percepção. 

  •  Entretanto, à medida que nossa consciência aumenta e o ego deixa de controlar nossa vida, não temos que esperar até que nosso mundo encolha ou entre em colapso por causa da velhice ou de uma tragédia pessoal para despertarmos para o propósito interior. Como a nova consciência está começando a surgir no planeta, é cada vez maior o número de pessoas que já não precisam ser sacudidas para despertar. Elas abraçam esse processo de modo voluntário até mesmo enquanto ainda estão envolvidas no ciclo de crescimento e expansão. Quando esse ciclo deixar de ser usurpado pelo ego, a dimensão espiritual entrará tão poderosamente no mundo através do movimento de saída - pensamento, fala, ação, criação - quanto por meio do movimento de retorno - silêncio, Ser e dissolução da forma.

  •  Até agora, a inteligência humana, que não é mais do que um aspecto minúsculo da inteligência universal, tem sido distorcida e mal empregada pelo ego. Chamo isso de "inteligência a serviço da loucura". A fissão nuclear requer uma inteligência superior. Usar essa inteligência para fabricar e estocar bombas nucleares é loucura ou, na melhor das hipóteses, uma estupidez extrema. A estupidez em si até pode ser inofensiva, porém a estupidez inteligente é extremamente perigosa. Ela está ameaçando nossa sobrevivência como espécie, e há incontáveis exemplos óbvios disso.

  •  Quando livre do desajuste provocado pelo distúrbio egóico, a inteligência entra em pleno alinhamento com o ciclo de saída da inteligência universal e seu impulso para criar. Passamos a ser participantes conscientes da geração da forma. Os criadores não somos nós, e sim a inteligência universal, que atua por nosso intermédio. Como não nos identificamos com o que produzimos, não nos perdemos no que fazemos. Estamos aprendendo que o ato da criação pode envolver energia da mais alta intensidade, mas que isso não é um "trabalho duro" nem estressante. Precisamos compreender a diferença entre estresse e intensidade, como veremos. A luta e o estresse são sinais de que o ego voltou, assim como nossas reações negativas diante de obstáculos.

  •  A força por trás do desejo do ego cria "inimigos", isto é, a reação na forma de uma força oposta de igual intensidade. Quanto mais forte o ego, mais forte o sentido de separação entre as pessoas. As únicas ações que não causam reações opostas são aquelas que se destinam ao bem de todos. Elas são inclusivas, e não exclusivas. Unem em vez de afastar. Não são para "meu" país, mas para toda a humanidade; não são para "minha" religião, mas para o surgimento da consciência em todos os seres humanos; não são para "minha" espécie, mas para todos os seres sencientes e para toda a natureza. 

  • Também estamos aprendendo que a ação, embora necessária, é apenas um fator secundário na manifestação da nossa realidade externa. O fator primário na criação é a consciência. Não importa quanto sejamos ativos, quanto esforço realizamos, nosso estado de consciência cria nosso mundo. Portanto, se não houver uma mudança nesse nível interior, a quantidade das ações que executamos não fará diferença. Vamos apenas recriar novas versões do mesmo mundo vezes sem conta, um mundo que é um reflexo externo do ego.